As cores

No cinema, as cores revelam uma outra dimensão.  A percepção humana cada vez mais aguçada alcançou a sétima arte com as cores saturadas de Kar Wai, o kitsch de Almodóvar, e antes deles, na explosão visual de Antonionni.  É como se já incapaz de alterar estados de espírito com a montagem, os angulos, e a composição que preenche a tela, as cores fossem o úlitmo apelo dos sensíveis.

A visualidade das cores nas letras veio do boom da publicidade e influenciou toda uma geração. Dos cut-ups de Allen Ginsberg às ironias dos Concretistas.  A estética a serviço de palavras que ganhavam outros significados graças a formatos e coresEssas colagens influenciaram as poesias do blog Cinestesia. Um trabalho bem menos pretensioso e visualemente mais simples. No começo, as palavras recebiam o vermelho para que fossem ressaltadas e o cinza como um sinal de relutância. E assim, o que eu escrevia só alcançava o significado máximo quando colorido pelas ferramentas mais simples de edição de texto.

Inicialmente, achei que a cor fosse um atrativo, mas para muitos o recurso era usado para enfeitar frases em redes sociais, ou se perdia em espaços muito prováveis. Aos poucos, fui descobrindo livros que usavam a cor, ou melhor, a palavra colorida, apenas como um recurso gráfico que agregava um valor supérfluo a obra. Esses dias, entrei numa livraria e vi uma versão bilíngue de uma obra machadiana que tinha páginas rosas com letras brancas e páginas brancas com letras rosas. Lindo! Mas o que pretendia eu afirmar com minhas cores dentro desse universo de tantos recursos?

Aos poucos a cor foi perdendo espaço. Primeiro, porque eu não tinha grana para publicar um livro cheio de letrinhas coloridas em vermelho na maioria de suas páginas e depois, porque a cor, tão importante pra mim, era um recurso amplamente utilizado.  Por isso, a versão final de Caos de uma vida sem sonhos apresenta poucas págianas coloridas, o que talvez nem faça muito sentido aos desavisados.  No lugar da cor, substitui minhas marcações pelo negrito.  E me perdi em jogos onde a página era um universo em branco a ser preenchido por linhas interessantes aos olhos.  Uma verdadeira busca da imagem onde não há imagem em si. A imagem como uma representação da dificuldade do personagem principal de chegar ao que chamamos de texto literário. Suas primeiras impressões do mundo, como um texto ingênuo e extremamente sincero.   E claro, que para isso contei com descrições cinematográficas, uma reordenação dos parágrafos e a idéia de marcar palavras como se fossem hiperlinks.  Abrindo-as para novos significados.

A imagem que pulsa ali é apenas um sinal de algo latente. Mas sei que apesar de tudo, as entrelinhas ainda são o mais importante.